Os operadores apontam que a fraqueza da moeda brasileira se deve ao desconforto em relação à situação fiscal.
Após duas sessões consecutivas de queda, nesta segunda-feira (23), o dólar à vista se valorizou e terminou o dia em R$ 6,18, o segundo maior valor nominal de fechamento na história. O Banco Central (BC), que havia realizado intervenções significativas no mercado cambial na semana anterior, desta vez não tomou medidas, limitando-se apenas à rolagem programada dos swaps cambiais tradicionais.
Em um dia de valorização global do dólar e com fluxo de saída de capitais habitual no fim do ano, o real teve o pior desempenho entre as moedas emergentes. Os operadores acreditam que a fraqueza da moeda está ligada ao desconforto com a situação fiscal e à nova piora nas expectativas de inflação apresentadas no Boletim Focus.
A análise predominante é que a redução do pacote de contenção de gastos aprovado pelo Congresso ameaça o cumprimento das metas fiscais nos próximos dois anos, fazendo com que a taxa de câmbio continue refletindo prêmios de risco elevados.
Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha adotado um tom mais moderado no fim da semana passada, reforçando a autonomia do Banco Central e a busca pela responsabilidade fiscal, há dúvidas se o ministério da Fazenda será capaz emplacar novas medidas de austeridade. Há receio também de dificuldades de articulação no Congresso após o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, voltar a suspender distribuição de emendas de comissão previstas até o fim de ano.
Com máxima a R$ 6,2010 à tarde, o dólar à vista terminou a sessão em alta de 1,86%, cotado a R$ 6,1851 – valor inferior apenas ao do fechamento da última quarta-feira, 18 (R$ 6,2657). Naquela ocasião, além da crise de confiança local, houve uma disparada da moeda americana no exterior, após o Federal Reserve sinalizar que há menos espaço para reduzir os juros em 2025. Em dezembro, o dólar já sobe 3,06%, o que leva a valorização no ano a 27,44%.
O gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, observa que ainda há fluxo de saída de fim de ano de empresas multinacionais e fundos, embora menor que o verificado na semana passada, em um ambiente marcado por liquidez reduzida às vésperas do feriado de Natal. Por ora, Galhardo trabalha com dólar na faixa de R$ 6,10 e R$ 6,30.
“O investidor estrangeiro está com o pé atrás e não se desfaz de suas posições cambiais defensivas. Enquanto perdurarem as dúvidas com o risco fiscal, não há como visualizar um cenário mais favorável ao Brasil no curto prazo”, diz Galhardo. “O BC entrou quando percebeu que havia distorções no mercado. Mas ele não vai entrar agora com uma tendência de dólar forte lá fora”.
Em dezembro, o BC injetou 27,760 bilhões de dólares no mercado. Apenas as vendas em leilões à vista, iniciadas em 12 de dezembro, superaram 16,76 bilhões de dólares. Reportagem de Cícero Cotrim e Célia Froufe, do Broadcast, mostra que a saída de dólares do Brasil entre os dias 2 e 19 de dezembro, de 14,699 bilhões de dólares, foi a maior para o período na série histórica do BC, iniciada em 2008. Considerando exatamente os primeiros 19 dias do mês, a maior saída até agora, de 12,651 bilhões de dólares, havia sido registrada em dezembro de 2019.
Entre as explicações para a magnitude do fluxo negativo figuram três hipóteses: dividendos maiores em razão do crescimento forte da economia neste ano, receio de aumento da tributação dos mais ricos (que seria utilizada para compensar isenção de IR para quem recebe até R$ 5 mil) e aumento de envio ao exterior por pessoas físicas.